Um dos meus passeios favoritos em Fortaleza é ir ao Parque do Cocó. É uma espaço fantástico, muito verde, onde se pode caminhar bastante tempo embaixo de árvores altas, ouvir os passarinhos e passarões cantando, os soins*, além de ver os sirizinhos na beira do igarapé que vai dar no rio Cocó. É um pedaço do paraíso ao alcance das mãos, dos olhos, dos pés e dos ouvidos – e a mente agradece aos sentidos por essa gentileza.
Vou ao Cocó sempre com esse objetivo, ser gentil comigo mesmo pelo menos uma vez na semana. E saio muito satisfeito quando me permito ficar por horas a fio, em silêncio, andando devagar e observando, sem pensar muito, a natureza, a minha natureza, a natureza dos seres humanos e dos seres não-humanos.
Fico feliz que muitas outras pessoas da cidade venham para cá também para passar um tempo. Muitas trazem seus filhos e é bom ter essa experiência na infância. Mas sei que nem todas conseguem apreciar o lugar completamente, e nem o tempo que ficam ali. Não conseguem estar no mesmo momento no lugar, com seus corpos e mentes inteiramente assentados. Uma grande parte corre absorta, buscando freneticamente se livrar das calorias da semana ou concentrada demais no próprio corpo para perceber a paisagem. Outras trazem o escritório consigo e fazem reuniões intinerantes, perambulando de um lado para o outro do parque na esperança de resolver seus problemas profissionais.
Não importa se o chão está molhado ou não. Se as flores estão abertas ou ainda em botão. Se um socó mais corajoso está comendo na beira do caminho. Se a vegetação está mais verde ou mais seca. Se o lago se formou num trecho do caminho e está cheio de garças ou está seco, esperando as próximas chuvas. O olhar está perdido alhures. O corpo pisa, mas não reconhece o chão. O nariz cheira, mas não distingue. O olho enxerga, mas não vê.
Às vezes, vamos para lá para relaxar, mas a força do hábito é muito forte e continuamos tensos. Os pensamentos nos tomam de assalto e quando percebemos estamos calculando contas, revisando agendas, programando compras, vendo quanto sobrou, falando da vizinha, do amigo que se separou, do namorado da outra...
Somente os pulmões gozam de um ar mais puro, mas, ora!, quando é que a gente se lembra que respira?
quarta-feira, 31 de dezembro de 2008
passeio
Postado por Samuel Cavalcante às 04:12 0 comentários
Marcadores: parque do cocó, passeio
primeiro...
Por que escrever? Não sei. Faço isso talvez na esperança de que o que escrevo ajude alguém, além de mim mesmo. Exorciso meus pensamentos e, talvez, os pensamentos alheios – alguém que leia e sinta o mesmo alívio e leveza como se os demônios que as chicoteassem por dentro fosse libertados, enfim! Mas, talvez, pode ser que os transfira sem querer para alguém desprevenido, alguém demasiadamente ansioso por leituras e que abre demais as janelas para o seu próprio interior.
Por isso, leitor(a), antes de ler as minhas crônicas (ou qualquer outra coisa) recite o mantra “Nada disso me afetará, a não ser que eu mesm@ abra a porta”.
Postado por Samuel Cavalcante às 04:04 0 comentários